A camisola,
ligeiramente justa, delineava-lhe os abdominais. Tinha esquecido,
permanentemente, os olhos brilhantes, a barba de três ou quatro dias que, na
minha opinião, a juntamente com o cabelo pequeno, lhe ficava realmente bem. Não
era grande apreciadora de tatuagens, no entanto, admirava a obra de arte
corporal que lhe preenchia o ombro esquerdo.
Esperava uma
reação de Ruben, tal como ele, provavelmente, esperava uma minha. A cabeça de
Maria girava impaciente, olhando-nos de soslaio.
- A sério,
meninos? Vão fingir que não se conhecem?
- Maria, tu não
devias… - Ripostei.
- A Madalena
tem razão, não devia ter vindo até aqui. O meu treino acabou por agora. – Uma
estranha forma de se despedir. Rúben rodou sobre si, em passos curtos e
precisos fitou os obstáculos até ao balneário masculino.
Não tinha
presenciado a boa disposição e humor característicos de Rúben, aliás ele nem
sequer me tinha dirigido uma única palavra. Sabia que o caso do seu processo
disciplinar e consequente suspensão ainda não estava concluído e, claro, a sua
possível saída do clube, tudo isto o estava a afetar. Neste momento, e apesar
da sua força, Rúben necessitava de todo o apoio, tanto dos fãs e adeptos, como
da família e amigos. E apenas eu me tinha afastado dele, fui a única que o
abandonei, quando lhe pedi para agir como se não me conhecesse quando ele mais
precisava de apoio. Que espécie de pessoa era eu?
As portas de
vidro que separavam as salas das máquinas da receção do ginásio afastaram-se
devido à força exercida por Rúben. Em marcha rápida, deixando a toalha que
segurava aos pés de Maria, tentava não embater em nenhuma máquina.
- Rúben! –
Chamava-o em voz alta, mesmo sabendo que as poucas pessoas que se encontravam
no ginásio olhariam para mim como se fosse mais uma fã louca do Rúben Amorim.
Rúben reagiu
instintivamente quando ouviu o seu nome pronunciado por uma voz que conhecia.
- Madalena?!
Atirei-me para
os seus braços, o meu corpo embateu contra o seu, cambaleámos ligeiramente. Os
meus braços depressa rodearam o seu pescoço, abracei-o fortemente, sentia falta
daquele toque, daquela sensação de proteção. Percebi, mais uma vez, que tudo o
que tinha feito não passava de pura estupidez e cobardia. As suas mãos,
lentamente, ocuparam espaço nas minhas costas, aplicando ligeira força, com os
corpos colados, o espaço entre nós ficou reduzido a nada.
- Ruben… - Chamei,
novamente, num sussurro, ao seu ouvido. Queria dizer-lhe que sentia a sua
falta, queria pedir-lhe mil desculpas, queria poder dar-lhe o meu apoio nesta
faze final. Imaginava como Rúben se sentia, não ter certeza do futuro, odiava
isso.
- Shiu. –
Ordenou-me e eu obedeci.
As suas mãos
subiram até às omoplatas, a sua cabeça, pousada até então, nos meus ombros,
parou de frente para a minha. Os meus lábios ansiavam, aliás necessitavam,
pelos seus, o desejo aumentava, o meu olhar entrara num bailado entre os seus
olhos e a sua boca. Milímetro a milímetro, medo a medo, a distância de escassos
centímetros diminuía, os nossos lábios humedecidos aguardavam impacientes.
Rúben inclinava-se lentamente e eu só pensava: «Não, Madalena! Oh meu Deus,
afasta-te, por favor!». Os meus olhos fecharam-se e os lábios entreabriram-se
ligeiramente. Senti um pequeno toque, desejei por mais. Esperava por mais, tal
não acontecia pois Rúben afastara-se de mim, e eu voltara a aproximar-me. Desta
vez, fui eu a unir as nossas bocas, numa corrida de urgência, desejo e paixão,
as suas mãos, agora na minha cintura, puxavam-me para si com uma certa avidez,
as minhas puxavam-lhe os pequenos cabelos da nuca e…
- Madalena,
não… - Rúben afastou-se de mim, novamente, suspirando. Passou-me pela cabeça
montes de coisas. Senti-me usada, Rúben já não queria nada comigo, por minha
culpa, só minha, perdera demasiado tempo a pensar no certo e no errado, a
pensar só em mim e esquecera-me de quanto Rúben agora era importante. - Não
podemos aqui, eu não posso envolver-me com a comunicação social, não agora. – A
minha expressão voltou a mudar. Então era isso?! Ele ainda queria alguma coisa,
certo? Apenas estava a ser cuidadoso, qualquer notícia com as palavras erradas
poderia mudar o seu futuro, um futuro quem nem ele ainda sabia o seguimento. E
claro, as revistas cor de rosa metiam-se sempre em tudo onde não eram chamadas.
- Desculpa, -
Pedi-lhe quando me apercebi que as pessoas continuavam a olhar estupefactas.
Depois do que acabavam de ver era óbvio que eu não era apenas uma fã louca e
desmiolada de Rúben Amorim, era, certamente, algo mais que as revistas e
jornais ainda não tinham previsto e muito menos desconfiado - isto foi um…
- Um erro? –
Tentou completar a frase que eu tinha deixado a meio. Um erro? Como poderia ser
um erro demonstrar sentimentos tão bonitos? Sentimentos que nem mesmo ele sabia
que existiam da minha parte, afinal eu só lhe dissera, há tempos, que o
adorava, mas eu também adoro os meus amigos, certo?
- Não, não foi
um erro. Eu ia chamar-lhe de… impulso.
- Impulso?
- A
necessidade, muitas vezes irresistível, que nos leva a fazer coisas sem pensar
não se chama impulso? – Aquele sorriso que não via há demasiado tempo
iluminou-o. Fez-me sorrir também.
- Sem pensar… -
Sabia o que Rúben poderia estar a pensar, o pouco que ele ainda conhecia de mim
dizia-lhe que eu nunca agia sem pensar. Era precisamente o contrário, eu
conseguia ser, na maior parte das vezes, bastante impulsiva.
- É quando
agimos sem pensar que fazemos as coisas que queremos fazer verdadeiramente.
- Tive saudades
tuas. – Que bom que era ouvir aquilo. O sorriso parvo que tinha na cara não
desapareceu, aumentou ainda mais. – Vem comigo, vamos sair daqui… - A sua mão
agarrou na minha para me conduzir para fora das instalações, mas eu impedi-o de
avançar.
- Sabes que
nada vai mudar, não sabes?
- Nada? – Ao
olhar-me nos olhos encontrou a resposta negativa, pelo que especificou a
pergunta novamente. - Nada mesmo?
- Não vou
voltar a pedir para saíres da minha vida, foi uma estupidez tê-lo feito, além
disso, não posso nem quero fazê-lo novamente.
- Mas em
relação nós, quer dizer tu e eu…
- A decisão do
futuro não me pertence. Eu sei o que é correr atrás de objetivos e superar
metas, por isso, se ficares serei a primeira a ir ter contigo para te pedir
desculpa por tudo e para remediar este tempo todo que agi como uma criança, mas
se fores também serei a primeira a largar-te a mão e a deixar-te ir.
- É justo.
Sabes, às vezes chego a sentir-me como um idiota, porque penso que não me vou
sentir mais culpado.
- Culpado? Do
que estás a falar?
- Por querer
quem quero. – Sabia que Ruben se estava a referir a mim.
- Rúben…
- Não, acredita
que eu entendo o teu lado. Mas, não me devia sentir assim, mas as tuas atitudes
deixam bem claro que eu não sou para ti o que tu és para mim.
- Isso não é
verdade! Eu gosto de ti, Rúben. – Dei entoação à palavra ‘gosto’ para que o
sentimento que nutria por ele fosse forçosamente entendido.
Rúben lançou me
um olhar de “Só podes estar a brincar”. Largou-me a mão que até agora segurava
para que o seguisse e voltou-se para as portas de vidro, agora novamente
fechadas. Agarrou no puxador mas não chegou a movê-la. Depressa a sua mão caiu
novamente junto do corpo, todo ele deu meia volta.
- Não. Se me
arrepender que seja por isto.
Um único passo
em frente permitiu que ficássemos novamente demasiado perto, nada fui capaz de
dizer. As suas mãos pousaram entre os meus ombros e o meu pescoço, os seus
lábios voltaram a encostar os meus. As minhas mãos sobrepuseram-se às suas,
cessou o curto beijo.
- Fico à tua
espera, Madalena. Sabes onde me encontrar.
Esperar, mas
claro, não para sempre. Rúben entrou nos balneários masculinos e eu fui de
encontro a Maria, que sorridente, se sentia com o objetivo cumprido.
- Eu não
ficaria assim tão feliz. – Fingi-me chateada com Maria.
- Hum, hum,
viu-se.
- Nada mudou,
sabes?
- Porque tu és
uma casmurra.
- O Rúben pensa
que eu não gosto dele como ele gosta de mim…
- É normal,
Madalena. Até eu penso isso!
- Mas não é
verdade…
- Não é a mim
que me tens de dizer isso. Prova-lhe.
- Já lhe disse
que estava enganado.
- Palavras não são gestos.
Quando se ama alguém é assim... Congradulations
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