segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

17º Capítulo: A tua sorte é que és...

 A maré tinha subido significativamente e o sol em breve iria nascer. Desta vez não podia insistir contra a ideia de Ruben me querer levar a casa, os táxis estavam parados.

 - Tu vais fazer um percurso enorme para me deixares em casa.

 - Não custa nada.

 - Claro, e tu não estás cansado nem nada.



***



 A noite realmente já ia muito longa quando chegámos a minha casa, a aurora cobria-se de variados tons de amarelo e azul.

 - Chegámos. – Bocejou, em seguida.

 «Tão teimoso.»

 - Ruben, a tua casa ainda fica longe e tu estás cansado. – Iria ficar preocupada até que uma mensagem de Ruben chegasse ao meu telemóvel com a informação de que estaria bem. – Podes ficar aqui em casa esta noite. – Ofereci, sem saber se me arrependeria logo em seguida.

 - Eu vou chegar rápido a casa.

 - É isso mesmo que me preocupa. – Condutores bêbedos, velocidade a mais, má ideia, definitivamente. - Fica.

 - Queres mesmo que passe a noite, ou o dia, em tua casa?

 - É, parece que sim, mas com uma condição.

 - Qual?

 - Tens de me preparar o melhor pequeno-almoço de sempre.

 Não aceitei um não como resposta. Mostrou-me um lindo sorriso de agradecimento e conduzi-o até minha casa.

 - Espero que não te importes de dormir no sofá, acho que é grande o suficiente para ti.

 - Arranja-me só um cobertor e não te preocupes.

 Sai da sala e, da pequena arrecadação retirei um cobertor que estava entre outros, arrumados na prateleira mais alta.

 - Aqui tens. Podes usar a cozinha, a cada de banho, tudo, como se tivesses em casa. Só não tenho é nada para vestires, pelo menos não de homem, mas se quiseres uma camisola minha ou algo assim, é só pedir. – Brinquei.

 - Hum… Deixa estar. Eu cá me arranjo.

 - Então, boa noite.

 - Dorme bem. – Despediu-se de mim com um beijo na face e deixei-o instalar-se.

 Entrei na casa de banho, onde repeti o processo que já era habitual antes de me deitar. O momento seguinte poderia ter sido tirado de um filme, abri a porta da casa de banho rumo ao quarto, ao mesmo tempo em que Ruben iria abri-la também. Apenas vestia os bóxeres, fiquei sem saber como agir, da minha boca nada saía. Os meus olhos fixaram a tatuagem que lhe preenchia o ombro esquerdo, o seu tronco era mais tonificado do que imaginara.

 - Pensei que estava livre. A casa de banho. – Esclareceu apontando para o seu interior.

 - Não. Quer dizer, sim. Podes ir. Boa noite. – Estava visivelmente atrapalhada, aposto que nas minhas costas, Ruben exibira aquele sorriso lindo por eu não ter dito coisa com coisa.

 «A sério, Madalena? Parece que nunca viste um homem seminu na praia», pensei. «E que homem! Para! Para de pensar naquele… Oh meu Deus! Ruben, vais acabar por… por… Oh esquece lá isso.»

 Caí na cama, cansada, esperando que o sono se apoderasse de mim, rapidamente. Tentei contar carneirinhos, tentei cantar, mentalmente, uma música qualquer, mas os meus pensamentos destinavam-se a atravessar o pequeno corredor e ir ao encontro da pessoa que repousava no sofá branco, em L, no centro da sala de estar.

 - Importas-te de dormir? – Perguntei-me, em voz alta, dando mais uma volta na cama.

 - Não consegues?

 Sobressaltada, os meus olhos viajaram até à entrada do quarto. Ruben encontrava-se de pé, encostado à parede, os seus braços cruzados na frente do peito. Olhava para mim.

 - Desculpa, assustei-te?

 - Pensava que estavas a dormir.

 - Não tenho sono. E não sou o único…

 - Parece que não.

 Sentei-me num lado da cama, o outro foi, logo de seguida, ocupado por Ruben. Conversámos durante algum tempo, até que o sono se apoderou de nós, e adormecemos, juntos.



***



 - Bom dia. – Dissera uma voz, longe.

 Senti uma leve brisa quente junto ao meu ouvido, em seguida pequenos toques, ligeiramente mais húmidos, na minha cabeça e, em sintonia, algo me acariciava os cabelos. Aquilo sabia bem. Escondi a cara debaixo da almofada, sabia do quanto desajeitada acordava.

 - Oh então, olha para mim. – Pedia-me com a voz a soar numa gargalhada.

 - Não.

 - Anda lá. Tenho uma coisa para ti. – Sentia as suas mãos acariciarem-me os braços, as costas.

 - É o quê? – Afastei a almofada e levantei ligeiramente a cabeça, desviando os cabelos que me impediam de ter uma visão total. – Hum… Pequeno-almoço. – Sorri-lhe.

 - Ei, ei. Não tocas em nada sem antes… - Ruben aproximava-se devagar, coloquei-lhe um dedo nos lábios, impedindo-o.

 - Primeiro o pequeno-almoço, depois lavar os dentes, e só esta comida toda estiver deliciosa é que ganhas um beijinho pequenino.

 - Estás a brincar, certo? – Disse com um perfeito beicinho de menino pequenino a formar-se.

 - Não.

 Puxei o tabuleiro para mim, certamente aquela comida toda era para os dois. Torradas, croissants, sumo, leite, fruta, Ruben tinha pensado em tudo, e a minha mãe que me desculpe, mas este foi o melhor pequeno-almoço de sempre.

 - Então o meu esforço merece ser recompensado?

 - Ruben, tu não tiveste trabalho nenhum.

 - A sério? Nem um beijinho?

 - Andas mal habituado.

 - Talvez porque nunca tive uma ‘amiga’ assim como tu.

 - Assim como eu?

 - Madalena, o que é que nós temos de amigos normais? Beijamo-nos quando queremos, já dormimos juntos,… Para ser como uma namorada pouco falta.

 - Ruben, nós já falámos sobre isto… Eu não quero oficializar nada sem ter a certeza do futuro.

 - Mas não é assim que deveria ser? Tu achas que o David não percebeu já? E o Javi? Eles que já te viram. E todas as pessoas que me conhecem?

 - Ruben, por favor, respeita a minha decisão, esta discussão não nos leva a lado nenhum.

 - Eu não estou a discutir contigo. E respeito a tua decisão. Só queria um beijo, e o pequeno-almoço até estava bom. – Tornou a fazer aquele beicinho adorável.

 - Sim, as torradas nem estavam queimadas, estou surpreendida! – Olhei para Ruben seriamente. – Eu só não gosto de me enganar.

 - Eu espero, mas até lá dá-me um beijo.

 - A tua sorte é que és… - Aproximei-me lentamente, e foi Ruben a unir as nossas bocas calmamente. A sua língua acabou por invadir a minha boca e, rapidamente o beijo calmo adquiriu um pouco de urgência. Foi Ruben a cessar, demasiado cedo.

 - Eu sou o quê?

 - Ahn? – Sentia a sua respiração, quente, demasiado perto dos meus lábios. Olhei os seus, um sorriso rasgado estava esculpido.

 - A minha sorte é que sou o quê?

 - Desumano. Irresistível. – Arrependi-me, logo de seguida, de ter dito estas palavras, e da forma como as disse. A curta distância de Ruben era uma espécie de hipnose para mim. Que nome poderia dar a isto?

 A um novo beijo eu dei início. Uma certa fúria invadiu-me, fiz com que ele se deitasse e eu sobre ele. As suas mãos voltaram a viajar no meu corpo, as minhas no seu peito. Embora o ambiente entre nós estivesse a aquecer eu sabia que Ruben me respeitaria e não tentaria nada comigo, pelo menos por agora. Ou estaria a pedir demasiado?


Sem comentários:

Enviar um comentário