segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

5º Capítulo: "Esquece o mundo todo"

 O Ruben tinha, escupido no rosto, aquele sorriso que nos últimos dias eu aprendera a admirar. Admirei-o um pouco mais antes de me juntar a ele. Tinha vestido uma camisola branca com decote em V, um casaco preto e uns jeans. Estava simples, mas bonito.

 A sua expressão facial mostrava que estava surpreendido por me ver ali, provavelmente pensou que eu não ia aparecer. A cada passo que eu dava baixava um pouco mais a cabeça e aquele sorriso parvo teimava em crescer.

 Cumprimentei-o de forma desajeitada, não sabia como agir, enquanto o Ruben estava bastante calmo e eu feita tonta apenas por um jantar que depressa acabaria e que nunca mais se voltaria a repetir, acreditava eu.

 Insistiu para que fossemos no carro dele, mais tarde voltaríamos ao estádio para que eu pudesse regressar a casa no meu próprio veículo. O Ruben continuava sem dizer onde seria o jantar.

 A conversa fluía normalmente, era fácil estar na sua companhia, na sua maravilhosa companhia. Não eram daquelas conversas banais, as palavras interessavam a ambos, falávamos de tudo, de tudo menos de futebol, entrar por esse caminho não era, de todo, uma boa ideia.

 Aproximávamo-nos da praia, já sentia a brisa ligeiramente mais fresca. Olhei para ele e a medo disse-me:

 - Espero que gostes de pizza. Não tive tempo de reservar mesa em nenhum restaurante. – Respondi-lhe apenas com um sorriso. Estava encantada, aquele parecia-me o programa perfeito. Ou era isto ou o jantar era algo feito pelo Ruben, e algo me dizia que só sabia fazer ovos mexidos, ou nem isso, visto que ia almoçar e jantar, todos os dias, à casa da sua mãe.

 Quanto mais nos aproximávamos, mais fascinada eu ficava. Ruben tinha escolhido a minha pizzaria favorita, a Pizzaria Beleal. Cozinha italiana, uma vista maravilhosa para a ilha da Berlenga, e àquela hora ainda podíamos ver o pôr-do-sol.

 A esta hora o pôr-do-sol já tinha começado. Aliás, já estava quase de noite, mas ainda podíamos ficar a admirar um pouco aquela arte natural.

 Estava demasiado frio para ficarmos na esplanada, por isso entramos e pedimos ao anfitrião uma mesa situada no canto da enorme sala. Sala essa cujas paredes tinham sido maioritariamente substituídas por grandes vidros. Assim, era oferecido aos clientes uma vista esplendida e quando acompanhados pela pessoa certa era um tanto romântica.

 O empregado, enquanto trazia as entradas, olhava para Ruben curioso. Talvez não fosse só ele, os clientes mais próximos de nós olhavam, uns mais discretos do que outros. Possivelmente não era normal um jogador de um grande clube ir jantar ali numa noite de quinta-feira. Eu, pessoalmente, nunca tinha visto lá nenhum.

 - Queres mesmo ficar aqui? – Perguntei preocupada com a nossa privacidade.

 - Queres ir embora? – Olhou para trás e percebeu o porquê da minha pergunta. – Não queres ser vista comigo?

 - Não estou a dizer isso, mas as pessoas estão a olhar.

 - Oh vá lá, esquece o mundo todo. As pessoas vão parar.

 - Isso é difícil como o que dizem sobre ti. – Disse num tom de sussurro que saiu demasiado alto, consequentemente, ele ouviu.

 - E o que é que dizem sobre mim?

 - Não lês revistas nem vês televisão? Não se fala noutra coisa se não no misterioso romance de Ruben Amorim com Vera.

 - Quem?

 - Vera, uma concorrente da primeira Casa dos Segredos da TVI.

 - Epá, outra vez essa história? – Percebi que não devia ter entrado por ali. Ruben estava num modo de quase fúria. – Eu já disse a Portugal inteiro que não conheço essa mulher!

 - Pronto, desculpa. Vê se te acalmas. – Se antes as pessoas presentes na pizzaria olhavam discretamente, agora nem se preocupavam em ser discretos. Ruben exaltara-se e a voz subira vários tons, o que despertou ainda mais a atenção dos presentes.

 - Não, desculpa, peço eu. Mas essa história já anda a passar dos limites. Se eu vi essa mulher alguma vez na vida foi só mesmo uma única vez, e nem a conheci pessoalmente, nem uma troca de palavras houve. Nada!

 - Não tens de dar explicações. Compreendo que queiras o teu nome limpo, mas sabes como as pessoas são, acreditam nos Midia acima de tudo.

 - As pessoas… As pessoas só sabem usar os outros para seu próprio proveito. E é claro, sai uma notícia qualquer sobre alguém famoso e vira escândalo.

 - Afinal a vida de jogador não se limita a uma bola…

 - Às vezes era bom que se limitasse. É ótimo quando somos reconhecidos apenas pelo nosso trabalho e por ser quem somos. Mas enfim, jogadores de futebol, as pessoas julgam-nos antes de nos conhecerem, para elas somos um monte de músculos sem cérebro que só se importam com futebol, raparigas e sexo.

 - Eu não penso assim… - Desabafei. O que o Ruben tinha acabado de dizer era a pura da verdade, as suas palavras simples tocara-me.

 - Tu és uma querida.

 Sorri.

 O empregado voltara novamente com os nossos pedidos. E que cheiro! Ainda os pratos não estavam em cima da mesa e já crescia água na boca. Tinha deixado que fosse o Ruben a escolher a pizza que seria o nosso jantar. Este homem tinha mesmo bom gosto, optou por uma com molho de tomate, queijo (muito queijo) e também muito fungui.

 Entre conversas e brincadeiras acabamos de jantar. Eu estava, como se costuma dizer, a rebentar pelas costuras, mas o Ruben ainda pediu para a sua sobremesa um Zabaione Gelado de Morango e Suspiros. Pela cara que fez ao ver a taça vazia, algo me dizia que estava com vontade de comer outro. Era uma autêntica comédia e sabia fazer rir sem o mínimo esforço.

 Chegou a altura de pagar a conta e a discussão habitual de um jantar começou. Quem pagaria a conta? Nunca concordei muito em que fosse o homem a pagar tudo, eu encarava isso como mais um sinal da antiga dependência da mulher ao homem e não como um sinal de cavalheirismo. Ainda tentei que pagasse cada um a sua parte, mas os meus argumentos foram inúteis. Chamou o empregado responsável pela nossa mesa, pediu-lhe a conta e pagou-lhe sob o meu olhar de desagrado. Por experiência própria já podia dizer que em qualquer discussão a persistência do Ruben era uma vantagem, pois tornava o jogo totalmente desequilibrado. Talvez tenha sido essa persistência e determinação que o levaram tão longe, que o levaram a seguir o seu sonho mesmo depois de todas as pedras que caíram no seu caminho.

 Estava a gostar tanto daquela noite que se antes desejara que a noite acabasse depressa, agora desejaria que o fim viesse muito devagar, pois esta poderia ser a única noite que passaria na sua companhia. Mas sabia que não duraria muito mais pois já era tarde e no dia seguinte tinha jogo.

 Já no carro do Ruben, aquele bonito Audi, a temperatura era bem mais confortável do que na rua. Agora teríamos de aproveitar estes últimos minutos que levaríamos até ao Estádio da Luz, onde estava o meu carro, para nos conhecermos melhor. O trânsito hoje estava um pouco mais traumatizante que o normal. Durante a viagem falámos um pouco de nós próprios. O Ruben contou-me o que faziam depois de ganhar um jogo, a equipa ia toda jantar, os casados levavam as respetivas mulheres, os comprometidos levavam as respetivas namoradas, depois havia os solteiros que levavam apenas a vontade de comer e o Ruben, para meu grande divertimento, confessou que levava a sua mãe. Achei piada, mas considerei como um gesto bonito, visto que mantém uma grande ligação os dois. Eu falei-lhe da minha origem alentejana, motivo para o Ruben gozar comigo o resto do caminho, falei-lhe da minha família, da minha terra, do meu gosto pelo desenho, e aqui elogiara-me deixando-me envergonhada.

 O caminho foi percorrido depressa demais. Ruben parou o carro mesmo ao lado do meu. Despedi-me dele com um beijo na cara, e sem discussão possível segui-me até casa para que tivesse a certeza de que eu chegara bem (como se eu não tivesse habituada a estar sozinha 24 horas por dia). Estacionei o carro, e já a abrir a porta de entrada do meu prédio acenei-lhe e pedi-lhe que quando chegasse a casa que me avisasse, pois já era tarde e assim eu ia dormir descansada. Vi-o abalar.

 Subi as escadas, o elevador à noite assustava-me. Entrei em casa, em comparação com a noite fria que se fazia sentir lá fora, esta estava bem quentinha e acolhedora. Repeti mais uma vez a minha rotina antes de me deitar: beber água, lavar os dentes, vestir o pijama mais quente que tinha, o mais apropriado para aquelas noites frias, e por fim, render-me à minha confortável e quente cama e preparar-me para mais uma noite de sono.

 A mensagem do Ruben não tardou a chegar. Já deveria estar em casa, embora que o conteúdo da mensagem nada disso dissesse.

(Ruben)  Da próxima vez que te convidar prometes que aceitas?


 Prometo. Adorei a noite J


 (Ruben)   Eu amei a noite. ‘Tou a adorar conhecer-te :$


 És tão mentiroso!
 Vá bonitão, vou dormir. Beijinho


 (Ruben) Até amanha minha alentejana bonitona.
              Dorme bem e sonha comigo :P
              Beijo

 Sabia que ele estava bem e finalmente podia render-me ao cansaço.



Espero que gostem!
Beijinhos, Jéssica.

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