sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

19º Capítulo: Adeus

 Percebi que Maria tinha toda a razão quando me permiti olhar nos olhos de Ruben por escassos segundos. Desde que a nossa amizade passou a ser algo mais do que isso mesmo, uma amizade normal, que eu nem dera oportunidade a Ruben de se exprimir, impus regras que agora me pareciam ridículas, embora soubesse que mais tarde voltariam a fazer sentido.

 A conversa fluía normal e agradavelmente, embora na maioria das vezes ficasse ausente do conteúdo da conversa, por vezes os meus pensamentos dominavam-me e transportavam-me para longe, para o futuro, para uma conversa que teria de ser realizada quanto antes, embora a minha vontade fosse retardar o momento mais um pouco.

 O futebol foi o grande tema, ia contra os instintos daquelas minhas amigas ter um jogador do clube de eleição e não falar sobre ele, sobre ele e sobre o David Luíz, visto que era o melhor amigo de Ruben e o ídolo de Maria, Joana e de Sofia, que não estava presente. Uma das coisas que tinha aprendido desde que conhecera Ruben era que as nossas conversas não podiam incluir o tema futebol, clubes diferentes, aliás, rivais, amores diferentes, nunca iriam acabar da melhor maneira, pois tal como ele, eu também defendia o meu clube com toda a garra.

 Agora que este pequeno encontro, para lanchar, tinha terminado, o medo invadiu-me, em breves instantes estaria sozinha com Ruben, dentro do seu carro. Maria e Joana despediam-se de nós, com Maria era mais do que uma despedida, o seu olhar fixou o meu e, fruto de uma enorme cumplicidade, transmitiu-me um aviso. Sem que os restantes se apercebessem, o olhar de Maria implorava-me para que tivesse cuidado com as palavras que iria utilizar, alertava-me para que não fizesse nenhuma asneira que mais tarde me iria arrepender e, acima de tudo, transmitia-me força.

 Ainda de pé, vimos o carro de Joana contornar a rotunda e, em seguida, desapareceu. Sem que nenhum pronunciasse qualquer palavra, ocupámos os respetivos lugares no carro de Ruben e saímos dali. Ruben conduzia na direção oposta à sua casa e, também, à minha, o silêncio dominava-nos. Provavelmente teria magoado Ruben ao agir daquela maneira quando tocou no assunto e também por não ter estado muito interessada na conversa, o que fez com que eu ficasse um pouco ausente. Estava na altura.

 Preparava, mentalmente, discursos para poder ter aquela conversa com Ruben, quando senti que o carro parara. Olhei em redor, não fazia a mínima ideia onde me encontrava, mas aquele de certeza que não era o destino que Ruben escolhera quando envergou por este caminho. Tudo o que via eram prédios altos e nós, dentro do carro estacionado ao pé de muitos outros.

 - Madalena. – Chamou-me. – Eu não devia…

 - Na verdade, devias. – Interrompi. – Devias tê-lo feito, pelo menos, há horas atrás. Eu nunca te ouvi, peço desculpa por isso e por só ter percebido agora.

 - Mas eu entendo o teu lado.

 - E eu não sei qual é o teu.

 - Nada depende de mim. Madalena, já te tinha dito e volto a dizer, eu sinto qualquer coisa por ti e não é uma paixoneta de miúdo, acredita. Quero ficar ao teu lado, só não sei é até quando posso ficar… - Pegou-me na mão que até agora estava pousada na minha perna.

 - Era tudo tão mais fácil se…

 - Se?

 - Se… Nunca te tivesse conhecido.

 - É isso que queres? Que me afaste de ti? – Ruben estava triste, e isso notou-se na sua voz, ao pensar que era isto que eu poderia querer.

 - Não, não quero. – Tremi só de pensar na ideia de nunca mais voltar a ver aquela pessoa que se encontrava ao meu lado, aquela pessoa que já me era tanto.

 - Eu sempre arrisquei tudo e, no geral, as coisas até me saíram bem. Tu pediste para esperar e é mesmo isso que eu vou fazer. – Ruben estava decidido, mas como é que lhe podia pedir para ir contra os seus princípios, até porque era isso mesmo que eu tinha feito até agora.

 - Não. Eu não te posso pedir isso.

 - Já pediste e eu já aceitei. É a melhor das hipóteses.

 - Hipóteses lançadas por mim…

 - Tu escolheste o que era melhor para ti. – Ruben estava a ser extremamente compreensível, eu não queria isto. Todas as minhas atitudes, pedidos, tinham a intenção de atenuar a dor que ambos viríamos a sentir quando nos separássemos.

 - Para nós, Ruben, eu escolhi porque me pareceu o melhor para ti e para mim.

 - Então fizeste uma escolha que me envolve sem saberes o que eu quero para o meu futuro?

 - É isso que te ando a tentar dizer.

 Ruben permaneceu calado por alguns instantes, de alguma forma ponderava sobre o meu erro que, na minha cabeça, ainda continuava a fazer sentido. Mas ele tinha razão, eu não podia tomar uma decisão sem o consultar. Agora estava nas suas mãos.

 - Eu continuo a fazer a mesma escolha.

 - Mas eu não quero que faças essa escolha. Se arriscas sempre tudo porquê parar agora?

 - Mas que raio queres tu? Queres que te diga que não quero esperar por ti? Queres que me afaste já que não te posso obrigar a ficar comigo?

 - Estou à espera que faças isso desde o início… Quero que penses e escolhas só a pensar em ti.

 - Então eu espero, mas não irei fazê-lo para sempre. Espero porque sei que mais uns dias e irei ter-te, na minha vida, como eu quero.

 - Mas tu podes ir embora…

 - Madalena, porque é que tu fazes as conversas chegarem sempre ao mesmo ponto? – Ia responder, não sei bem o quê, quando Ruben retirou do banco de trás um jornal com alguns dias. – Toma, lê.

 Li o pequeno título que Ruben me indicara e a esperança voltou a nascer em mim.



Vieira segura Ruben Amorim
Luís Felipe Vieira e Ruben Amorim reuniram antes do Natal e o presidente do Benfica não está recetivo a deixar sair o internacional português para o Génova de Itália, apurou o CM.

Fonte revelou ao CM que o líder dos encarnados ouviu os argumentos do médio, que gostaria de ser mais utilizado em ano de Campeonato da Europa (2012), mas também fez ver ao atleta que ele faz parte do projeto e é um jogador à Benfica, pelo carisma, sentido de responsabilidade e pela forma como é bem encarado pelos companheiros. Ruben Amorim é um dos capitães do clube.
O Génova pretende comprar a totalidade do passe de Ruben Amorim, mas a presença do jogador na Luz é tida como essencial por Luíz Filipe Vieira e também pelo treinador Jorge Jesus para atacar o título de campeão nacional.
Fonte contactada disse ao CM que o presidente do Benfica sente grande carinho por Amorim, um jogador que se sacrifica pelo clube e que já passou por momentos difíceis – na época passada esteve largo tempo lesionado e não pôde dar o contributo à equipa, um dos fatores apontados internamente como causa para a época menos conseguida das águias.
A relação de Amorim com Jesus e Vieira é muito boa e só os poucos minutos de jogo estão abaixo das expetativas do futebolista, que deixou perceber a insatisfação num estágio da seleção nacional a 3 de Outubro, antes dos jogos frente à Islândia e Dinamarca, de apuramento para o Campeonato da Europa de 2012. “É uma opção do míster Jorge Jesus achar que não devo jogar no Benfica. Fico feliz por Paulo Bento pensar de outra forma”, disse o jogador, de 26 anos, que tem contrato até Junho de 2013 e uma cláusula de rescisão de 20 milhões de euros.


 Sabia o que aquilo significava, mas mesmo assim, só quando tivesse a certeza que Ruben ficaria em Portugal me sentiria segura, feliz. Estava a ser egoísta, supostamente deveria querer o melhor para ele, mas não conseguia deixar de pensar em mim também. Mas a notícia que acabara de ler não significava só meio caminho para Ruben ficar, senti-me também orgulhosa dele.

 Li e reli a notícia à procura de alguma palavra que mudasse todo o sentido que esta parecia tomar. Nada, tudo estava bem explícito. Por fim, fechei o jornal e voltei a dobrá-lo ao meio, devolvi-o a Ruben, que esperava que eu dissesse alguma coisa.

 - Não vais mesmo?

 - Madalena, não sei… - Olhou-me como se se preparasse para me dar uma má notícia. – Aconteceu uma coisa durante o primeiro treino e estou suspenso, com um processo disciplinar…

 Eu leio jornais, por isso sabia exatamente o que tinha acontecido. Também sabia as consequências que, a sua atitude errada, traria: o aceleramento do processo de saída do clube encarnado.

 - Eu tenho uma pequena ideia do que aconteceu. – Sentia-me um pouco enganada. Era óbvio que Ruben sabia as consequências que viriam, no entanto, não me tinha dito nada.

 - Tu já sabias?

 - Já. E também sei que te queres ir embora, mais do que tudo.

 - Isso não é verdade.

 - Não? Esperei, muito sinceramente, que fosse uma verdade torcida, que não tivesse sido tão grave como agora sei que foi… - Poder-me-ia arrepender do que ia fazer para o resto da minha vida, tudo o que Ruben me dissera até hoje me parecia um eufemismo. – Leva-me a casa, por favor.

 - Madalena…

 - Ruben, por favor.

 O carro voltou a funcionar, abandonámos o estacionamento que tinha sido palco de meias verdades, meias mentiras, meias decisões. O percurso até minha casa foi feito mais uma vez em silêncio, embora que, desta vez, estivesse grata. Por vezes, sentia os olhos de Ruben postos em mim, mas eu não me permiti olhar para ele uma única vez e, teatralmente, apreciava a paisagem que se desdobrava à minha frente. Finalmente senti este aperto um pouco mais aliviado quando avistei aquela que tinha sido a minha casa por dois anos e, seria por mais qu0anto tempo eu permanecesse em Lisboa. Este aperto diminuía, mas outro depressa crescia, a decisão em função das ações de Ruben estava tomada. Parou, finalmente, o carro em frente da porta do prédio.

 - Queres que suba contigo? – Ruben quebrou o silêncio quanto eu me preparava para sair.

 - Não. – Respondi bruscamente.

 - Já percebi. Então, é isto que tu queres?

 «Meu Deus, eu vou-me arrepender tanto disto!», pensei, com toda a certeza.

 - Não, foi isto que tu provocaste. – Sentia-me magoada, e queria magoá-lo também. Queria poder dizer-lhe que a culpa era toda sua, das suas mentiras, ou omissões da verdade, de ter aparecido na minha vida no momento em que não precisava de ninguém. Ao contrário da minha vontade, fiquei calada. – Adeus, Ruben.

 Entrei rapidamente, sem olhar para trás. Num instante, as palavras que Joana me dissera um dia começaram a fazer sentido, por essas palavras nós tínhamos discutido, ela tinha-me magoado. Mas e se ela tivesse parte da razão?

 Subi, a correr, as escadas até chegar ao meu andar, o elevador era demasiado lento, desejava chegar a casa o mais rápido possível. As mãos tremiam, a chave não queria entrar na fechadura para abrir a porta. Respirei fundo, repetidamente, com calma abri a porta, calma essa que se evaporou quando atrás de mim deixava a mala caída no chão e fechava a porta com demasiada força. Em largas passadas, cheguei à sala de estar, esta ainda apresentava vestígios da passagem de Ruben, levei o cobertor para a arrecadação e arrumei as almofadas, alcancei o telefone e marquei um número bem conhecido.


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